sábado, 26 de janeiro de 2013

ARTIGO UNICAMP


Aprendendo a ser professor/a por meio de processos reflexivos.
Palavras chave - Reflexão, docência, experiência.

Introdução
O subprojeto do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS) - campus Inconfidentes toma como eixo central o papel da reflexão no processo de formação docente. Isso significa que, para além da oportunidade que o projeto oferece aos licenciandos de que experienciem o ambiente escolar e desenvolvam atividades de ensino junto aos alunos da rede pública de educação básica, busca-se desenvolver entre a equipe (coordenadora, supervisores e licenciandos) uma comunidade de aprendizagem na qual se promovam processos de reflexão que criem oportunidade para a explicitação e compartilhamento de conhecimentos e concepções sobre a docência. Parte-se do pressuposto de que a dimensão prática do fazer docente, quando considerada de modo estanque, contribui apenas para a cristalização de concepções e de preconceitos, não permitindo uma aprendizagem da docência que tome a escola e tudo o que nela ocorre como um cenário no qual múltiplos fatores relacionam-se de complexa. Com o objetivo de promover tais processos reflexivos, foram escolhidas duas ferramentas reflexivas: o registro escrito (individual) em diário reflexivo e reuniões coletivas de todo o grupo (coordenadora, supervisoras e  licenciandos) para planejamento de e discussão sobre as atividades realizadas. Tais reuniões são conduzidas com o objetivo de promover processos reflexivos que tomem a prática docente como objeto de crítica permanente. Pretende-se, assim, desenvolver nos licenciandos uma ampliação de sua capacidade de análise crítica do fazer docente, superando as explicações óbvias e as relações do senso comum que tanto têm prevalecido nas análises sobre a qualidade da educação brasileira nos sistemas públicos de ensino. 
            No contexto do subprojeto tem se desenvolvido uma pesquisa que tem como objetivo verificar as potencialidades e limitações das ferramentas reflexivas na formação inicial no contexto do PIBID como programa de formação docente.
Objetivo
O objetivo da pesquisa aqui relatada é o de identificar potencialidades e limitações no uso dos diários reflexivos para a aprendizagem da docência.

Metodologia
Os dados foram coletados dos diários reflexivos dos licenciandos e das suas participações nas reuniões coletivas semanais. A análise, ainda em nível inicial, é de cunho qualitativo e, neste primeiro momento, buscou identificar: a) elementos a partir dos quais se possa descrever as aprendizagens dos licenciandos a partir dos instrumentos de reflexão e b) dificuldades e limitações no uso destes instrumentos explicitadas pelos licenciandos.
Fundamentação teórica
A perspectiva sobre a formação docente que este projeto adota coaduna-se ao paradigma da racionalidade prática, tal como este é descrito por Mizukami  et al.  (2002).
Nesta abordagem, a formação docente é entendida como um processo contínuo que se dá ao longo da vida do professor   e não em momentos estanques de formação (KNOWLES e COLE, 1994). Ao longo do continnum que é o seu processo formativo, o professor produz os conhecimentos que orientam a sua prática, configurando um quadro de teorias pessoais  sobre o ensino. Assim, o professor é compreendido como sujeito de conhecimento e não como simples executor de ações planejadas e definidas em esferas exteriores a ele. No entanto, a natureza dos conhecimentos que o professor coloca em ação na sua prática cotidiana é distinta da natureza dos conhecimentos científicos. O que não significa que, na elaboração de seus conhecimentos, o professor não lance mão dos conhecimentos teóricos que possua. Significa apenas que, ao tomar decisões na escola, o professor não aplica automaticamente os princípios que apreende da teoria, mas elabora novos conhecimentos, carregados das particularidades pessoais e contextuais.
No continuum de seu desenvolvimento profissional, o professor estabelece relações (nexos) entre experiências de vida, valores, aprendizagens formais e informais, objetivos profissionais etc. O processo de reflexão é entendido como aquele capaz de promover o estabelecimento destas relações e de aumentar o nível de consciência do professor sobre as suas teorias pessoais de ensino.  A reflexão na prática docente pode ser definida, segundo citação de Mizukami  et al.  (2002),  como:
[  ]uma ação que implica uma consideração ativa, persistente e cuidadosa daquilo em que se acredita ou que se pratica, à luz dos motivos que o justificam e das consequências a que conduz. (Zeichener, 1993, p.18)
            Importante é ressaltar que existem distintos níveis de reflexão, desde o técnico até o crítico, este último entendido como aquele que é capaz de promover a análise ética e política da própria prática (MIZUKAMI  et al., 2002).
Diversos têm sido os instrumentos que a literatura e a prática formativa docente têm adotado no sentido de fomentar processos reflexivos nos docentes em formação, tais como os casos de ensino, os diários reflexivos, as biografias, as histórias de vida, os portfólios (CUNHA, 1997; FALKEMBACH, 1987; KNOWLES, COLE, PRESSWOOD, 1994; MIZUKAMI, 2000; ZABALZA, 1994). Todos estes instrumentos privilegiam o uso de narrativas, sobretudo escritas, que podem ser entendidas como a maneira mais autêntica de expressão das experiências humanas (CLANDININ, CONNELLY, 2006). O fato de se dar ênfase à expressão escrita dos docentes nestes instrumentos refere-se à possibilidade que a escrita oferece para a reorganização de ideias e de sentimentos (CUNHA, 1997).
Autores têm apontado a necessidade de que os processos reflexivos na formação docente sejam coletivos, incentivando o estabelecimento de comunidades de aprendizagem nas quais o desenvolvimento docente é potencializado pelas trocas entre pares (MIZUKAMI  et al., 2002)
Considerações finais
            Os resultados, ainda preliminares, apontam para dois conjuntos importantes de conclusões.
            O primeiro deles corrobora a tese de que os instrumentos reflexivos potencializam a produção de sentidos e a construção de significados para a prática docente. É possível identificar a partir dos instrumentos reflexivos, que os licenciandos vão ampliando sua compreensão sobre os aspectos que interferem na aprendizagem escolar dos alunos, desde aqueles relativos às motivações intrínsecas para estar na escola até as condições mais amplas delineadas pelas políticas públicas. Alguns trechos extraídos dos diários reflexivos podem ilustrar essa afirmação.
“a partir do momento que comecei a observar também o comportamento dos alunos, veio uma análise de como eu me comportava na escola quando era aluno de ensino médio, na verdade o perfil de pesquisar e procurar informações além da sala nunca foi meu forte, esse é o comportamento típico de aluno mesmo, mas hoje fico pensando muito em como mudar essa situação” (Carlos, diário reflexivo)
“temos que deixar claro qual é o nosso OBJETVO na sua (da atividade de ensino) realização, além disso, o professor tem que despertar no aluno o desejo por aprender; já que este desejo não vem pronto e sim o professor busca maneiras de fazer com que o aluno realmente adquira esse interesse” (Maíra, diário reflexivo)
“Depois que fizemos a atividade fiquei pensando em como é difícil montar uma atividade e ainda ter o domínio da turma e cheguei a ponto de pensar que isso seja um dos motivos desestimulantes da carreira de docente, é muito trabalhoso, sacrificado e muitas vezes não é valorizado.” (Jéssica, diário reflexivo)
“percebemos que o problema não era apenas por parte dos alunos, era também a falta de organização e, o que é mais importante, o interesse e o prazer de dar aula.” (Miller, diário reflexivo)
“é necessário  que haja uma conscientização do papel da escola  na divisão social.” (Tamires, diário reflexivo)
“Nos direcionamos para a sala de aula e um dos alunos me disse ‘- Você é a única que chega com um sorriso no rosto’ E realmente parece que não há muita simpatia durante as aulas. Uma relação de harmonia entre alunos e professores parece que deixa a aula mais agradável e menos mecânica.” (Rovânia, diário reflexivo)
           
            Estes tipos de dados, no entanto, ainda necessitam de uma análise mais criteriosa, a partir, por exemplo, das categorias de conhecimento da base de conhecimento para o ensino (SHULMAN, 1986), a fim de se verificar as potencialidades das ferramentas reflexivas para promover a ampliação desta base.           Outro conjunto de dados remete a algumas limitações quanto ao uso de diários reflexivos pelos licenciandos. Tais limitações referem-se às dificuldades que os licenciandos apresentam no uso do diário reflexivo como instrumento para reflexão. Os registros nos diários, algumas vezes, atêm-se a aspectos menos subjetivos, como a descrição dos eventos nos quais os bolsistas participarem como agentes ou como observadores. Apesar de reconhecer que mesmo este tipo de registro não deixa de ter a sua dimensão subjetiva, o que se está pretendendo destacar aqui são aqueles tipos de registros que mais se aproximam de um relatório de tarefas e de observações do que propriamente de diários reflexivos. Outros registros são superficiais, próprios de quem escreve com pressa ou com maior distanciamento temporal dos eventos aos quais os registros se referem. Tais dificuldades puderam ser explicadas no contexto do projeto pelos seguintes fatores: a) pouca familiaridade dos licenciandos com os registros pessoais escritos; b) necessidade de disciplinar-se e de distribuir o tempo dedicado ao projeto de modo a contemplar a escrita dos diários; c) dificuldade dos licenciandos em realizar registros escritos durante as atividades do projeto. Resta saber se a experiência com este instrumento será capaz de superar, e em que medida, tais dificuldades.
Referências bibliográficas
MIZUKAMI, M.G.N.  et alEscola e aprendizagem da docência: processos de investigação e formação. São Carlos: EDUFSCAR, 2002.
KNOWLES, J.G.;COLE, A.L.; PRESSWOOD, C.S. (1994) Throug preservice teacher´s eyes: experiences through narrative and inquiry. New York: MacMillan College Publishing Co.

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